segunda-feira, 18 de abril de 2011

Poema nascido entre as cinzas (Ivan Junqueira - 1934)

Não, não chamemos ninguém.
Tampouco façamos barulho.
Essa algazarra, esse zunzum
de nada valerão agora:
o que há pouco era vertigem
em pó se desmanchou.
Fiquemos, pois, imóveis.
E observemos ali, na penumbra,
onde meigamente um todo se dissipa,
as dádivas esquecidas pelo tempo.
São poucas: um fragmento
cloroformizado de aurora, um trecho
agonizante de magia, um afago
de suor evaporado.
Guardemos as dádivas
e, no abismo que desabrocha
- rosa da madrugada -
em nossa carne deserta, sepultemos
a espessa, subterrânea nostalgia
deste pálido carnaval feito de ver.

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